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Trovadores Contemporâneos - Parte III

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Por fim, nas cantigas de escárnio e maldizer, de gênero satírico, encontramos como tema a crítica, a difamação e a ironia. Especificamente na cantiga de maldizer, a crítica não é velada, portanto revela-se o nome do insultado e apresenta um conteúdo mais agressivo. Na canção, Geni e Zepelim , de Chico Buarque, é possível conectar os aspectos das cantigas de maldizer. Geni, protagonista da música, é maltratada e atacada pela população da cidade, que se referem a ela de forma sórdida. Vejamos a letra da música: Geni e o Zepelim De tudo que é nego torto Do mangue e do cais do porto Ela já foi namorada O seu corpo é dos errantes Dos cegos, dos retirantes É de quem não tem mais nada Dá-se assim desde menina Na garagem, na cantina Atrás do tanque, no mato É a rainha dos detentos Das loucas, dos lazarentos Dos moleques do internato E também vai amiúde Com os velhinhos sem saúde E as viúvas sem porvir Ela é um poço de bondade E é por isso que...

Trovadores Contemporâneos - Parte II

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Já nas cantigas de amigo, tem-se o eu-lírico feminino apresentando a figura da mulher camponesa, que expressa sua paixão e seus lamentos. Por não ter  seu amado por perto, ela faz uso das cantigas para compartilhar, com sua mãe, irmã ou amigas, sua tristeza. Em algumas é possível encontrar também um diálogo entre a camponesa e seu confidente. Na canção Você faz falta aqui , de Maiara e Maraisa, vemos alguns aspectos dessas cantigas. Além de apresentar voz feminina, é perceptível a lamúria da mulher pela ausência de seu amado. Vejamos a letra da música: Você faz falta aqui Você, você, faz falta, falta aqui, aqui, aqui Que o som, o som bate, bate, volta, volta, volta Não tem mais nada entre o chão e o teto, teto, teto Só o eco, eco, eco, eco Tem certeza que você levou tudo? Tem certeza que não esqueceu nada? Eu só sei que até o criado mudo Do seu livro preferido sente falta É que eu te vejo em tudo, em cada canto dessa casa Nos cabides, nas gave...

Trovadores Contemporâneos - Parte I

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Depois de termos analisado o Trovadorismo em seus vários aspectos, podemos afirmar que encontramos alguma semelhança entre o processo de elaboração das cantigas medievais e a produção musical contemporânea? Comecemos pelas cantigas de amor: sabemos que o amor, despertado no eu lírico pela "senhor", era irrealizável e muitas vezes direcionado a uma mulher casada e integrante da nobreza. É o amor cortês, que como não encontra acolhida no seio da mulher, gera sofrimento, ocasionando o "amour de loin" (amor de longe). Na canção "Mina do condomínio", o compositor, Seu Jorge, descreve uma situação parecida com a das cantigas medievais. O eu lírico se angustia porque a vizinha não lhe dá atenção. Vejamos a letra da música: Mina do Condomínio Tô namorando aquela mina Mas não sei se ela me namora Mina maneira do condomínio Lá do bairro onde eu moro Tô namorando aquela mina Mas não sei se ela me namora Mina maneira do condomínio L...

A mulher medieval

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              A mulher medieval é olhada sob dois diferentes ângulos pelos trovadores.                        Nas cantigas de amor, o trovador fala de uma mulher idealizada. Ele se dirige à dama na esperança de que ela pudesse entender sua coita. Com o objetivo de uma elevação espiritual, o poeta mantém distância de sua amada. É um amor purus dentro do modelo proposto pelo caritas no universo cultural cristão. Isso deve justificar por que, na maioria das vezes, o trovador se apaixonava por mulheres casadas. Afinal, se o amor é irrealizável, na teoria, não há possibilidade de adultério.                  [Cantiga de Amor de João Garcia de Guilhade] A bõa dona por que eu trobava, e que nom dava nulha rem por mi, pero s'ela de mi rem nom pagava, sofrendo coita s...

As cantigas trovadorescas - Parte III

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Cantiga de escárnio e maldizer As cantigas de escárnio e maldizer possuem viés crítico, sarcástico e irônico. [...] cantigas que os trovadores fazem quando querem “dizer mal” de alguém, estabelecendo em seguida uma diferença no que diz respeito ao modo: assim enquanto que nas cantigas de maldizer a crítica seria direta e ostensiva, nas cantigas de escárnio a crítica seria feita de modo mais subtil, “por palavras cobertas que hajam dous entendimentos” (ou seja, num registo de dupla leitura, o "equívoco", ou hequivocatium, nas palavras do mesmo anónimo autor). Tanto a cantiga de escárnio quanto a de maldizer são do gênero satírico. A diferença  de uma para a outra é que na primeira a provocação é indireta enquanto na  segunda o insulto é direto e agressivo. Pero Garcia Burgalês [Cantiga de escárnio e maldizer] Nostro Senhor, que bem alberguei quand'a Lagares cheguei, noutro dia, per ũa chúvia grande que fazia! Ca proug'a Deus e o juiz achei, ...

As cantigas trovadorescas - Parte II

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Cantigas de amigo A cantiga de amigo tem a presença da voz feminina e expõe a paixão da camponesa. Naquela época, a voz feminina não tinha uma “imagem a zelar” (diferente dos homens nobres), tendo maior liberdade de expressão. Por isso, os trovadores utilizaram-se dela para fazer cantigas sobre o amor carnal/físico, o eros . Vejamos: [...] a voz feminina que os trovadores e jograis fazem cantar nestas composições remete para um universo definido quase sempre pelo corpo erotizado da mulher, que não é agora a senhor mas a jovem enamorada, que canta, por vezes num espaço aberto e natural, o momento da iniciação erótica ao amor. Desta forma a velida (bela), a bem-talhada (de corpo bem feito) exterioriza e materializa de formas várias, formas essas enquadradas numa vivência quotidiana e popular, os sentimentos amorosos que a animam: de alegria pela vinda próxima do seu amigo, de tristeza ou de saudade pela sua partida, de ira pelos seus enganos – os sentimentos que o trovador ou...

As cantigas trovadorescas - Parte I

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A cantiga é uma forma poética em que os trovadores uniam letra e som. São três as principais cantigas galego-portuguesas: a cantiga de amor, a de amigo e a de escárnio e maldizer. Cantiga de amor A cantiga de amor tem como tema fundamental a coita e, também, conta com a presença da voz masculina. Mas, afinal, o que é a coita? A coita é a dor do amor cortês, é o sofrimento derivado da impossibilidade de realização do amor. Vejamos o que diz José D’Assunção Barros: O Amor Cortês, criação original dos trovadores que foi tão bem traduzida pelas cantigas trovadorescas de amor e pelos romances corteses do período medieval, não raro podia levar ao desespero, à paixão desmedida, ao desejo de morte diante da impossibilidade de realização da união com a mulher amada. Pois bem, é sobre esse tipo de amor que o trovador discorre em suas cantigas de amor. Ele está sempre lamentando o amor impossível devido à estratificação social. Além disso, o amor cortês está relacionado ao amor...